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O (estranho) dilema do Évora.

Toda a gente gosta de futebol e touradas. Poucos admitem gostarem de touradas, mas gostam, muitos. Isso é lá com eles, não venham é depois chorar baba e ranho sobre aquele cão agastado de pústulas e solidão que viram abandonado ao pé da A2 quando se dirigiam até ao Algarve para tostar os pouco miolos que possuem. Como em tudo nesta vida, dois pesos e duas medidas, nunca resultam, 

Já sobre o futebol, o fartote de gente que vive aqueles pontapés, cabeçadas e peitaças, é de um ridículo estudo que fiz em conversas pelas diversas empresas onde trabalhei, amizades que travei, conversas ébrias que escutei e literalmente quase toda a gente que conheci em 51 anos de vida, confirmando-me a estupidez do mundo. Não só o meu, o português, o europeu...o mundo inteiro. O mundo inteiro é absurdo nas suas paixões por bolas!

Agora, quando saímos destas áreas e nos dirigimos a outras modalidades, assistimos a mais dramas. Há drama em todo o lado. Tomemos em conta o mundo do atletismo. E, não somente aquele onde os seus atletas realmente recebem os incentivos necessários para irem além do corpo e da mente e conseguirem assim alvíssaras na forma de medalhas e recordes. Isso reflecte-se apenas em países onde o dinheiro, ou flui por todos os lados, ou é direccionado, concentrado a fazer o próprio país melhor do que parece. Não. foquemo-nos em países onde não há dinheiro para nada, para velhos, professores, enfermeiros, nada...ou então, aquele muito que existe, só se destina aos bons 'modernos gladiadores' os que atraem as multidões e adormecem o juízo em um torpor: os futebolistas e os toureiros...por exemplo. - Há estudos. Tudo são estudos. Tudo é relativo ao que importa.

Mas, também existem bons atletas de outras modalidades que a ninguém importa, excepto quando nas notícias se lê a parangona de este ou aquela recebeu mais uma medalha e agitou determinada bandeira por uma pista de glória. Falo das 'estrelas' do atletismo. Portugal sempre foi prolífico nestas.  Ninguém lhes conhece os nomes, por regra, menos um ou três que ficaram gravados e já não há nada a fazer quanto a isso. Foram-no! Todavia, continuam a serem-no. Esta caganita de país, ou brota ou assimila atletas de topo que nos fazem parecer tão bem perante o resto do mundo que raia a estranheza.

Mais estranho ainda é que estas criaturas pouco endeusadas, fustigam-se em situações impossíveis e mesmo assim atingem os mais altos patamares. Alguns são ensinados a venderem-se às marcas e até fazem boa vida às suas expensas. Outros nem têm dinheiro para umas boas sapatilhas. É um processo, suponho. Alguns singram outros nem por isso. Não é assim também a vida comum?

Dentre estes, alinho o Nélson Évora e o Pedro Pichardo. O primeiro, cabo-verdiano de origem, o segundo, cubano. Ambos, no atletismo, honram ou já honraram as nossas cores. Portugal!

Aqui dá-se o caso de uma polémica que muitos dizem ser de inveja, ou de perda de posição face a um jovem contendor. Évora arrasa Pichardo nas redes sociais à conta de, a este segundo lhe ter sido celeremente concedida a cidadania lusa em prol do primeiro que demorou uma década a consegui-la. Como sempre surgem os comentadores, aqueles mesmos que julgam as opções do treinador que perdeu a partida ou que arrasam a sorte de caras do cavaleiro-toureiro.

Este dilema não é exclusivo nem único. Nelson Évora, apesar de bem dotado, é humano à mesma, e talvez que, sentindo-se excluído explodiu verve onde havia de ter professado contenção. Quem sabe. Ou acho que não, que está certo. Por que raio há de ser tudo tão políticamente correcto hoje em dia? Se o homem se sente injustiçado, não há-de poder dizê-lo? Fica mal? Que se dane! 

Pedro Pichardo tem 29 anos, Nélson Évora tem 38. A simples diferença de idades implica uma passagem de testemunho (e eles nem competem nesta modalidade), que é justa e acertada. Agora, se Évora se sente prejudicado porque não recebeu as mesmas benesses que Pichardo ao tempo igual em que este as recebeu, isto deve-se apenas a circunstâncias de tempo e nada mais. Quando o primeiro veio para Portugal tinha 9 anos, não era ninguém que o Estado pudesse investir ou acelerar o processo de naturalização. Já o segundo, em 2018 já se encontrava a representar Portugal, e actualmente detém o recorde de Cuba com a marca 18,08 m e o recorde de Portugal com a marca 17,98 m.

É português agora, pronto! Acata Nélson!

É drama, tudo é drama. A minha sorte é que não gosto de futebol, nem de touradas nem de atlestismo. Gosto do meu país e por vezes engulo sapos para manter esta paixão. Por isso, amo o Ronaldo, ou Évora, o Pichardo e não ocorre nenhum nome de toureiros...amo-os a todos, por fazerem de Portugal o David que dá lições a muitos Golias por esse mundo fora.

Gosto tanto disso.


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