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Escrever ao contrário de um Fim.


Escrevo isto em rescaldo porque sou activista de muito pouco. 
Ou melhor, escrevo isto 'à posteriori' apenas porque ninguém me pede e paga para expressar publicamente a minha opinião sobre seja o que for, e por isso não o faço no mesmo trilho de qualquer rebanho, assim só por 'dá cá uma palha', e muito menos em montras mais sérias e avalizadas. Serei egoísta, e sou-o, porém, neste aspecto concreto daquilo que escrevo aqui, encaro-o mais como um egoísmo de pouca monta, um 'fait-diver', vá. Apenas porque o escrevo aqui "no meu Mundo..." em vez de o fazer em plataformas mais credíveis e visíveis ou em alguma publicação mais digna, seja online ou em papel. 
Há muito ressabiamento aqui? Há, sim senhor, gostava muito de o poder fazer aí, mas não consigo, não lhes chego, só que mesmo isso não me impede de o escrever, e de acreditar que acabo por ser mais honesto do que muitas vezes o são 'os consideráveis de nome próprio' ou 'os senhores mestres da racionalidade ocidental', que se alongam em constantes crónicas e artigos de opinião muito influenciáveis em publicações atrás mencionadas. - Não faz mal nenhum. Nenhum.
Não ando aqui a disparar a torto e a direito, é preciso escrever-se muito sobre tudo e todos, mal ou bem, em nome próprio ou em nome de alguma profunda frustração, pouco importa. É mais necessário do que nunca escrever sobre a rapidez deste mundo, sobre as suas maravilhas e sobretudo sobre os seus intervenientes mais nefastos. Expô-los, opinar, debater, não calar, jamais calar. É preciso escrever mais, antes que a escrita acabe abolida por decreto.
Adiante. Tudo o que acabei de escrever atrás diz respeito ao Brasil de ontem, não sei, ouso imaginar, mas não sei do que dirá sobre o Brasil de amanhã.
Porque se concerne menos ao Brasil e a Bolsonaro do que à enraizada carência humana na busca pela aceitação e validação. Porque é um fundamento basilar humano a vontade da inclusão, ainda que nos aterrorize por vezes, ou que nem disso nos apercebamos, paradoxalmente confirma-nos a autonomia contra a razão, concedendo-nos a legitimidade face aos nossos agravos. Isso, e também a intrínseca maldade humana de todos, que anda de mão dado com o melhor de todos nós. Ninguém o quererá admitir, mas, um voto no Diabo para se castigar um demónio, ou uma vara destes, pode acabar por nos custar o preço de um completo Inferno. 
Por isso me decidi escrever o que aqui lêem. É tão egoísta e ressabiado tê-lo escrito hoje, quanto os 55 milhões de brasileiros que votaram ontem.
As pessoas cansam-se da solidão, dos maus-tratos, de não serem bem-quistas, das muitas misérias que compõem o ramalhete da desgraça humana, e por isso entregam-se cegas a causas improváveis, por muito nauseantes que lhes pareçam, entregam-se, porque estão fartas e só querem pertencer a uma realidade melhor do que aquela que vivem. Os discursos políticos mais polarizadores, tem essa incandescência, iluminam o espírito dos mais fracos, dos mais oprimidos, já por demais ressabiados com a vida que não lhes permite avanços, só recuos dramáticos. Tornam-se egoístas fervorosos e apostam em um recomeço que pode bem vaticinar-lhes o fim.
Durante séculos lutou-se, e em grande parte essa mesma luta persiste, pela liberdade de expressão. Hoje em dia é tão fácil a expressão que deixou de ter valor intrínseco. Aliás, é tão fácil que um exército de 'bots' a contrato (isto são pessoas que trabalham afincadamente em salas semi-escuras em computadores, alicerçando na mentalidade comum da opinião generalizada uma posição concertada de um indivíduo ou de um grupo - 'hackers', propagadores de 'fake news', 'lobbystas' e prevaricadores determinados por um ideal pago, que disseminam a desinformação e o caos.) - Peço desculpa pela utilização de tantos estrangeirismos, mas é mesmo assim que se percebe o mundo hoje em dia. Ora, todo este processo, desde o ataque cibernético russo às eleições americanas de 2016, da evangelização poderosa da odiosa campanha Bolsonaro, até ao professor universitário português que afirmou que: "as empresas não podem ser acusadas de discriminação por decidirem não contratar um homem para vigilante de um internato de rapazes caso este seja homossexual, ou por não contratarem uma mulher que se candidate a um trabalho de modelo apenas pelo facto de esta ser recém-casada" - derivam de um e só processo de contra-informação que está na base na destruição irredutível e absoluta da liberdade de expressão, nos moldes em que foi e para que foi conquistada. Em efeito, a mesma liberdade que tanto custou a conquistar é hoje em dia tão facilmente manipulável pelas forças políticas e sociais, como arma de destruição massiva em favor dos seus propósitos, que se instalou uma confusão predominante, difícil de desprovar. Foi assim que a Hillary Clinton foi afastada da hipótese de fazer história e ser eleita a primeira mulher presidente dos Estados Unidos e é assim também que o Jair Bolsonaro participou activamente no processo de destituição de Dilma Roussef, com um dos discursos mais asquerosos da história de qualquer parlamento, pós-segunda grande guerra, acabando ontem por ser eleito presidente no Brasil.
A liberdade de expressão parece trabalhar em nosso desfavor, aparentemente creditando-nos a vontade para depois nos furtar a liberdade.
Assim que este texto, como muitos outros que tem sido escritos um pouco por todo o mundo, nos mais variadíssimos lugares por uma quantidade infindável de gente, é menos egoísta e ressabiado do que aparenta, pois está já escrito, veicula a minha opinião, que é totalmente desimportante de qualquer alinhamento ou concordância com outras, foi escrito, e dentro de momentos irei carregar no pequeno botão que diz: 'Publicar', e este texto andará sempre disponível para quem o quiser ler e reflectir e discordar e repugnar e aplaudir. Porque o que importa contra o fim é nunca desistir de falar, de escrever. Jamais!

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