- A culpa invariavelmente clama por um castigo, e esse castigo traz uma cura específica para cada consciência febril.
- Oh! E será essa a única cura possível?
- Claro que não. Frequentemente, a compreensão ou o perdão, ou ambos postos a trabalhar em conjunto, produzem os mesmos resultados.
- Entendo. Só espero que a descubras então.
- Ok.
- Ok?
- Sim, que culpa tens tu de não quereres saber nada sobre alguém que não se ajusta à tua cura diária?
- Nenhuma, suponho. Não tenho culpa alguma ligada à tua.
- Mas, se tivesses, que castigo te proporias a auto-infligir?
- Um, que nada tivesse a haver contigo. Não sinto culpa por nada que seja nosso, ou teu. Só tenho culpas pessoais. E essas, guardo-as para mim apenas. Nestes tempos de agora, as culpas de cada um não são matéria para exploração comum. Não há maior sinal de fraqueza.
- E claro que não te sentes fraco, certo?
- Sinto pois, mas não mostro. Deus me livre...
- Ok.
- Ok?
- Pois... Assim que te sentes absolutamente ilibado de mim, é isso?
- Julguei que a minha distância já to tinha explicado cabalmente.
- Pelo contrário. A culpa tem uma forte tendência à clandestinidade, à distância, à escuridão. Os culpados fazem de tudo para parecerem inocentes, é a sua mais exacta perdição, não o sabes? Mesmo aqueles que disto se apercebem, não o conseguem contrariar. Arrumam-se involuntariamente num oposto ao que merecem e isso ilumina-os logo, como que marcados por uma letra escarlate. Um fogo tremendo e inescapável.
- Que exagero!
- De todo. Sentes-te assim tão limpo de culpa perante mim, é? Não crês que me feriste de algum modo, de qualquer modo? O sofrimento que creio que me causaste é-te totalmente indiferente, é isso?
- Está tudo na tua cabeça. O crime, a culpa e o castigo irrelevante e subsequente. Eu limitei-me a ser quem eu fui sempre e quem eu sou. Se interpretaste outra coisa qualquer na nossa relação, é óbvio que a culpa nunca poderá ser minha. Eu fui o que sou, e assim continuarei a ser. Ileso.
- Fugitivo da verdade.
- É tão impróprio me estares a acusar disso, logo tu...
- Oh!
- Claro que logo tu. E as mentiras que escreves e a não-verdade em tudo que és? Pretendes incitar-me a falar sobre o assunto?
- E tu, nunca me pediste nada? Nunca imaginaste que esta relação gradualmente se foi tornando unilateral? A sério que nenhuma culpa te ataca por isto?
- Oh, agora me apercebo! A Amizade! É isso?
- Então estamos entendidos, Ok?
- Sim, claro.. Ok!
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