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O Paradigma de estar onde não quero.

Por definição, uma rede social haveria de ser um mecanismo dedicado à aproximação de pessoas. Existem teorias e teses que o comprovam à priori. Mas, como toda a imperfeita estrutura insana destes tempos keynesianos, que rejeitam a lógica da informação perfeita, até as definições já não são aquilo que eram, e há sempre lugar a uma análise solta do que sucede a posteriori. Na prática, cada vez mais é um factor de reclusão individual, chegando a extremos de exclusão social.
Isto porque as pessoas que maioritariamente, utilizam estes serviços "sociais", fazem-no por um conjunto de razões, quase todas completamente umbilicais aos seus próprios egos, ainda que amiúde, focadas na honestidade daquilo que exprimem, ou intentam exprimir. É sempre um chapéu de dois bicos, uma ambiguidade por excelência.
Mas o índividuo honesto dificilmente precisa de contar para além dos seus dez dedos das mãos, para enumerar os seus amigos, acrescentando, em caso extremo, os seus dez dedos dos pés, para os conhecidos mais chegados, e o resto que se amontoe numa papa de números aleatórios. 
Simplicidade meus caros, simplicidade, simplicidade! Digo: ocupai-vos de dois ou três afazeres, e não de cem ou mil; contai meia dúzia de amigos em vez de um milhão e tomai nota das receitas e despesas na ponta afiada daquilo que importa. 
A meio do agitado mar desta vida dita universalizada, tantas são as nuvens, as tempestades, as areias movediças, tantos são os mil e um imprevistos a ser levados em conta, que para não se afundar, para não ir a pique antes de chegar a bom porto, o índividuo social tem de ser um cabrão de um calculista para lograr algum êxito. Ou então...
Ou então entregar-se ao nada. Porque tudo é demasiado rápido para se pensar seriamente. Tudo é sacudido, posto radicalmente em discussão inane. Fútil, por ser excessivamente letal pela rapidez do imediatismo da situação. A superfície, antes congelada, das verdades e dos valores tradicionais está despedaçada e torna-se difícil prosseguir no caminho, avistar um ancoradouro seguro. - Irei eu, matar-lhe a vitalidade virtual, antes que ele me mate a minha? - É avassalador. Ou não? - Pode bem ser um total desmascaramento que nos revela a abissal ausência de todo o fundamento.
Se um dia vier a ter um sotão, e o encher com as tralhas da memória, e se, um dia, vier a passar um dia nesse mesmo sotão a esvaziar arcas velhas, talvez encontre provas tangíveis de um passado credível. porém, nenhuma delas estará directamente relacionada com esta realidade de colibri que não admite erros.
Mas é uma ferramenta! - Exclamarão os pragmáticos nihilistas. - Sim, é. É um posto de observação colossal, donde tudo se observa, e onde apenas os titãs vivem, tudo o resto, sobrevive na sua pacata existência, mais ou menos incisiva perante a parca audiência que consiga arrebanhar. - És um péssimista por natureza. Um pobre invejoso que despeja veneno contra a própria matemática que o tornou obsoleto. - Pois sou. Serei? - As redes sociais são o estudo do universo e a sua conservação e limpeza. São-nos incutidos os conceitos avançados da filha-da-putice, e tenta-se constantemente a negociação de equações formalmente insolúveis, como forma de alcançarmos um lugar mais alto nesta hierarquia ficcionada.
Tomemos o facebook como exemplo; absolutamente demoníaco, a meu ver. O método consiste em estudar a página e eliminar do campo visual tudo o que não seja imediato. De seguida, elimina-se tudo o que for escrito em demasia, focando-nos naquilo que não tem nada de permeio: as imagens. Tão depressa se instiga a velocidade dos tempos virtuais, que a realidade se torna uma quase introdução ao deus do vício. Confrontámo-nos com este universo através de leituras informais e saídas e entradas rápidas de campo.
É uma espécie de paliativo do exacto tempo real que nos incomoda. O virtual analisado sob a perspectiva de um correcto tratamento dentário. Indolor, sem demora, quase uma praga internacional de mentes embotadas.
Atentem que tudo isto é opiniativo. O número crescente de boletins facebookianos e de anúncios de personas fundamentais ao desenrolar de um mundo perfeito de cultura, informação e desenvolvimento de como a esfera da vida normal haveria de ser, inspira-me a acreditar que tudo isto é válido, que tudo isto é lógico, tem razão de ser. Todavia, ao pensar no Facebook, por exemplo, vejo-me incapaz de o desassociar, com a teoria de Schrödinger, e do seu gato, meio vivo, meio morto. A explicação quântica aplicada à rede social em questão, conduz-nos à repetida incoerência aplicada no ambiente em causa. Somos e não somos relevantes, até ao momento em que tudo se despedaça e liberta o próprio veneno que nos mata, sem que ninguém em redor possa afirmar certamente, se de facto, estaremos vivos ou mortos, sãos ou dementes, sérios ou irónicos. De cada vez que leio o boletim sarcástico vivo do facebook, apetece-me voltar à escola e aprender a estar vivo novamente.
E, como nada consigo contra esta maré, chego a acreditar que estou morto de facto. Que sou um falhado na vida real, e deveria por um fim em tudo. É desconcertante!
Concluindo: Fiz amigos reais, vendi a minha arte, interessei-me por tanto e desiludi-me com mais. Fui estrela por bem menos que os famigerados quinze minutos que o Andy firmou, e um perfeito falhado durante o resto do tempo. É que eu não percebo isto. Não sou deste tempo suponho. Sempre que me embrenho a sério neste mundo a fingir, começo a fazer planos para largar tudo e desaparecer. Não posso. Faço parte desta falácia como todos os outros, e devo continuar, quanto mais não seja pela simples vontade de existir.


Casimiro Teixeira

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