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A minha vida depois de ti.


Quando me morreste, eu era feito de lama,
todo eu era mais sujo que o mais áspero e vulgar dia.
Tentei limpar meu rosto no teu ventre,
limpar-me todo da vergonha do meu estado,
da dureza imunda do meu ser contaminado.
Quando me morreste, nem te falei de tudo o que te fui roubando,
em vida.
As gargalhadas, as danças, mesmo os teus tremores de cama,
quando me morreste, nem assim me perguntaste,
se cá dentro ainda havia,
amor, ou só o silêncio que aos poucos te foi matando.
Morreste-me sem dedos em mim,
que simulassem os gestos do tanto que me amaste.
E eu, enquanto o mau mundo só meu,
não mais me redimia,
fui-me arrastando, descendo o mais baixo que podia.
Quando me morreste, despentei o meu cabelo
despi-me por baixo da merda e vim-me,
despejando em ti o meu próprio fim,
sem pensar sequer neste meu crime.
Quando me morreste, o mundo inteiro escureceu,
em meu redor,
tornou-se água impura, lodaçal onde chafurdo como torpe animal
e havendo um mundo sem ti,
nunca será senão remorso, para um homem que endoideceu,
um homem que pouco vale.
Quando me morreste estavas nua,
casta e puta, aberta, lenta e infinita
estavas exacta, livre, pura, mulher, mulher...estavas horizontal, ali,
prostrada debaixo do teu algoz,
voando sobre as coisas de sujidade, de desgraça, de decadêndia da morte,
morrias tu e era eu que desaparecia,
com o peso da culpa desta sorte.
Da má sorte que senti quando me morreste. 
E ainda houve tempo para ouvir um fio da tua voz,
perdoando-me por saber que eu também morria.

Casimiro Teixeira
2013




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