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Merda! Hoje faço anos outra vez.

Soube-se, já era tarde nesse dia de Fevereiro, sobre um homem que, receava ser pequeno demais para o corpo enorme que ocupava. Não lhe cabia nada naquela alma diminuta, de tão irrisória de incertezas. E então, esse mesmo homem, desalmado, diziam alguns, foi anotando com cuidado o que tinha de memória dentro do corpo, a ver se lhe crescia uma alma de jeito em solavancos de vida, aos olhos dos outros. 
Foi, literalmente, construíndo uma alma com pedaços de outras almas para parecer grande e se sentir gente. Tão tolo que ele era. Ai, que tolinho por se encher de medo para tapar um vazio. Quis florir crisântemos num campo de lama inóspita. - E já se aperceberam de certeza do anagrama mal velado.
Certos homens nascem para ser pequenos, alguns, são de facto, pequenos para sempre, pois o Universo precisa desse equilíbrio entre grandes e pequenos para existir.
Este homem, sim, este homem, pegava no fogo que trazia no peito e desperdiçava-o em inutilidades, convencido que, seriam as inutilidades a darem-lhe o impulso quixotesco de que necessitava. Ai que tolo, tão grande tolo!
Os homens são todos pequenos, todos insignificantes à partida, e só os grandes sobressaiem das sombras comos cogumelos renascidos da podridão.
Mas, ele não o sabia. Não queria saber, ou, fazia de conta que não podia saber.
O homem é só chicha quente e amorfa, ossos sólidos, sangue estagnado e a irracionalidade de estragar tudo. O homem é uma onda gigante que vem, destrói, e vai embora, sem remorsos. As ondas não sentem.
Todavia, ele não o sabia, ele não sabia, a sério!
Parecia determinado em complicar tudo. Quase uma coisa entre o querer e o fazer naturalmente, evitando a naturalidade genuína da alma pelo meio. Vou ali e apresento um livro, estou aqui e escrevo diariamente... tolices! - Na grande maioria dos dias, bebia até se tornar um desalmado honesto novamente. Bebia e fumava como um morto a prestações.
As mulheres queriam-no longe, porque cheirava mal e era feio, gordo, disforme e atrapalhava a natural descendência da humanidade com a sua existência infecta. - Oh, que tolo era este homem! - Nenhuma palavra o salvaria do fim que lhe destinava a falta de alma eterna. Era grotesco e aos ogres ninguém lhes perdoa um deslize, grosso modo, a falta obscena de não terem nascido homens bonitos.
Porém, e por ser tolo, ele acreditava ainda em tudo. Queria crer à viva força, que as palavras o salvariam a tempo do arrasto inevitavel da eterna nulidade.
Este homem era feito de uma erudição plebeia, de uma criatividade sem razão nos dias em que vivia, e por isso, sim, por isso mesmo, esse homem morreu cedo demais.
Morreu, porque não há lugar para sonhadores num mundo de gigantes, é uma aflição espiritual que não pode ter lugar certo neste mundo de extraordinários titãs de almas direitas.
Soube-se mais tarde, nesse exacto dia, que era o seu aniversário, e que, os desalmados, são o que de mais próximo existe de humanidade neste mundo de enormes malditos. Assim passou mais um ano sem haver nada de nota na sua vida.


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