Avançar para o conteúdo principal

Tenho-te?



















Tenho-te, como se fosses só uma.
tenho-te minha, 
e aqui te carrego, onde albergo o que nunca me melindra,
nos profundos mares revoltos que me perfazem o peito.
Tenho-te...tenho-te em parte pequena, 
em parte minguante, e em parte crescente.
Tenho-te em parte nenhuma.
Tenho-te por pouco, pelo pouco de mim que até se adivinha,
nesse engenho inteiro que tomo pelo teu jeito,
logo perdido, assim que te tenho distante.
Não te tenho de todo.
Logo eu, que sou tão feio, marcado, moribundo...
que sou fraco por ser fraco, e porque assim me fiz.
e que nem encontro beleza no que perfaz,
o tudo mais de belo e de profundo,
desse inteiro e sólido modo,
que sempre me recolhe nas alturas das horas más.
Tenho-te? - Nem aí estou.
Tomara eu que te tivesse...
E que fizesses tu cair,
os males taciturnos que me aniquilam.
Quem dera ter-te cá dentro, se ao menos eu pudesse,
entrar em ti, e de ti subtrair, o que sou.
Começar de novo, e voltar a sentir,
os beijos eternos que esses lábios destilam.
Tenho-te nunca, tu és mais do que simples mulher.
Perdi-te para sempre na ilusão de te ter,
imaginando-te objecto que à força da vontade,
quis que fosse infinitamente meu.
Tenho-te nada, nada, nada...
que o poder de ter-te minha foi loucura deste ser.
Sonhei-nos juntos, e nesse éter acabei por te perder.
Vivo agora nesse sonho passado, tempo sem idade,
e de tanto te querer, nem bem sei quem sou eu.
Mero toque sinistro de uma paixão já acabada.
Ainda assim insisto,
tenho-te, és minha, e mais não sou que um escravo.
De tanto te perder, nem bem sei onde me perco,
Tive-te, será melhor escrever sobre o passado,
pois esta altura nem admite o dizer que não desisto.
Tenho-te...tenho-te...aqui encravo,
de ti me afasto, não mais me acerco.
Pus finalmente um fim, neste amor inacabado.

Comentários

  1. A única certeza quando temos algo é a de que não o teremos para sempre.

    ResponderEliminar

Enviar um comentário

Este é o meu mundo, sinta-se desinibido para o comentar.

Mensagens populares deste blogue

A queda de um anjo triste.

Desafogados brilhos desta existência, quis olhar em frente, e vi somente escuro. Escuro, escória, lixo, lama e penetrante breu. Quis seguir em frente e não mo permitiram. Quis marcar presença, caí, e fui banido. Quis viver, e fui marcado a fogo com o rótulo do nada. Malditas palavras que me acendem esta vivência, pudera eu ser livre, e não viver por trás deste muro. Ser vento, ou poeira, e correr solto pelo esplendor deste céu. Malditas palavras que de mim emergiram, ainda mal as proferia, e já as via, abafadas em seu ruído, como se fossem pássaros, abatidos em revoada. Como eu mesmo, abatido assim, em tenra idade. Mas sosseguem, pois sou coisa irritante que insiste em não morrer. Malogrado pela estupidez do desprezo, sou, ainda assim, Homem! Homem! Homem... Estou vivo, e não desabo. Desafogado percurso que ainda mal começa, não verás teu fim nesta desdita amordaçada. Quis dizer o que quis, e não me faltou a vontade. Mais fáci...

...Poderia ser maior! Poderia ser um escritor, em vez deste blogue vagabundo que... foda-se!

  "On The Waterfront" 1954 - Elia Kazan

O Artista que faz falta Conhecer

Um dia desenhei um rectângulo largo em uma folha de papel-cavalinho, não foi salto nenhum, pois em anos antigos, já me tinha lançado a fazer rabiscos aqui e ali. Em pastel sobretudo, e uma vez cheguei ao acrílico, mas aquilo eram vãs tentativas sem finesse alguma. As artes plásticas são um mistério ainda, e uma das minhas grandes decepções como ser humano criador. Essa e a música. Creio até que terei começado a escrever por me faltar jeito para o desenho e para os instrumentos de sopro. Assim que voltemos ao meu rectângulo. Esquissei-o de vários ângulos e adicionei-lhes cornijas e janelas. Alguns sombreados. Linhas rectas e perspectiva autónoma, cor e até algum peso acumulado. Longe do real mas muito aproximado deste. Quando dei por mim tinha o Mosteiro (Stª. Clara) desenhado, em traços grosseiros e pôs-me feliz ter chegado ali, até me dar conta que cometera plágio. O meu subconsciente foi buscar o trabalho do Filipe Laranjeira ao banco da memória, e sem me pedir licença, copiou...