Acordei hoje sobressaltado, corri até à secretária e esperei que se acalmasse o estrépito de cavalos que sentia no peito, até me decidir a escrever isto. E justo hoje, que me deitei cedo e dormi uma noite justa de sono calmo.
Bem se diz que para cada coisa há o seu avesso, embora, não imagino ter sido essa, a razão do meu despertar alvoroçado. Sentado na cadeira, com o suor do medo ainda a escorrer-me pelas costas, encharcando-me a roupa e a alma febril, senti um pressentimento de catástrofe. Pensei que enquanto pudesse permanecer quieto e calado, era como se nada fosse, mas aquela ideia fincara-se com garras de metal na minha disposição matinal, e por mais que tentasse não havia forma de me esquivar da minha própria cabeça.
O dia finalmente clareou e começou a evaporar-se a humidade do orvalho, envolvendo-me a janela com uma ténue bruma. Tinha passado duas horas quieto na escuridão, olhando para dentro de mim, tentando desviar-me dos calafrios persistentes, ocultando-me de mim próprio para não me sentir mais aterrorizado. O cheiro da manhã flutuava no ambiente da sala e se entranhava em todas as coisas. Ato contínuo, o próprio portátil aberto embaciara-se, julguei ser também por medo, até perceber que a manhã tinha-se impregnado em tudo. Nas paredes, na minha roupa, nos móveis, ocupava todos os espaços, filtrando-se pelas gretas dos lugares ocultos da minha sala, e o velho macintosh não escapava à curiosidade destes dedos aquosos.
Como sempre, os pesados reposteiros estão corridos em todas as outras janelas, exceto esta, somente a minha convida a manhã a entrar, dá-lhe as boas-vindas e pede-lhe para ficar para o pequeno-almoço. Lá fora a rua está tão quieta quanto eu, talvez tenha despertado sobressaltada também, mas não acredito muito nisso.
- Tu inventas cada uma! - discutia eu com os meus botões.
Quis responder-me de volta, mas a voz saiu-me estrangulada.
Não respondi de todo, porque me distraí a pensar que o melhor seria escrever em vez de perder tempo a falar sozinho, apesar de na verdade não ter a certeza de ser bem capaz de entregar às palavras a descrição do que me fez despertar nesta manhã. Sorri sem dar bem conta, e julgo que esse sorriso secreto mudou-me completamente a disposição. Conhecia o meu próprio sistema de vigilância emocional, e um sorriso basta-me para me desmantelar o medo do cenho matinal.
- Foi um pesadelo apenas, nada mais! - Retorqui por fim em voz alta.
Só depois me lembrei que já era Setembro, e o livro ainda não chegara, nem os convites tampouco, e pouco mais de uma vintena de dias se interpunham entre esta manhã e a do lançamento. Foi então que o terror voltou e instalou-se sem condições, até agora.
Gostei!!! Descobri outra página, também. Parabéns pela tua actividade literária. :)
ResponderEliminarObrigado Odete, são palavras como essas que me despertam a alegria e me fazem esquecer os medos. A outra página que descobriste foi a dos livros? casimiroteixeira.blogspot.com
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