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A ilha deserta do Mundo

 

A lógica consegue colocar em contradição o interlocutor mais pertinente. Estes meses, semanas, estes dias, todos os minutos destes dias. Todos os longos e amargos segundos, vividos à margem da triste e isolada vontade de viver em pleno, de poder existir às abertas, de caminhar entre outros corpos quentes e normais, sem medos, suportado por mais abraços e beijos do que talvez mereceríamos em situações normais. Mais do melhor que realmente nos torna humanos, perto deste paradoxo insolúvel de realmente sê-lo.
Junto ao equilíbrio pertinente e sem poder concretizá-lo. Foda-se. Sem poder algum, impotente, sem ter a capacidade de o poder fazer como nos apetece, só como nos dizem que deve de ser. Mas tem de haver soluções para este paradoxo. Se fosse mais inocente, diria: a realidade não existe realmente, logo, este problema também não. Parece-me portanto, que, mesmo assim, todos estes meses, semanas, dias, minutos, segundos profiláticos, são muito melhores do que a alternativa.
É por isso que também digo à boca toda: Fiquem em casa, caralho!

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