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Má semente




(...)
Não tarda nada e descubro-te só dias melhores
ordenados
nas roupas que deixaste para trás.
Desenho-te o corpo quase todo em luz salgada,
branca, branca... feito ondas de joy divison.
Acendes-me a mais antigas das febres,
e por ti partirei todos os vidros no céu.
Quão perfeita é a liberdade dúctil destas ondas nocturnas,

afagando-te em espuma, os tornozelos corajosos, 

caules perenes desses olhos cristalinos
.
Amanhece novamente e,
ninguém nunca gostou do nosso bairro.
Ninguém nunca gostou do nosso Mar.
Não houve poeta algum, nesta terra dos nossos
que se lembrasse de escrever sobre um lugar
onde destas ondas não se alevantaram arranha-céus.
E houve tanta gente, longe de nós... longe de mim.
Tanta gente cheia de poesia que nem produz
sentido algum para a crucificação do verbo amar.
Forrados de desprezo. É a sua condição natural.
Fizemos dos nossos dias a espera por este poema febril.

Mas habitamos onde a poesia não tem código-postal.

Assim, 
vou vendo aos poucos quem te devora,
 
vez por outra chegam polícias cheios de cicatrizes
querendo te algemar a luz,
branca, branca... como o nascer da primeira hora.
Do teu corpo a felicidade

é tudo um jogo de monopólio.

Ninguém jamais gostará de onde a apatia se demora,

como se fossem beijos que perduram sem proveito,
de nós, ninguém gostará jamais da nossa paz fundeada,
de solitários nadadores sem peito.
Nada alguma vez foi escrito sobre estes dias tão nossos,

ficaram assim, pendurados nos demais, os que já tinham sido.

Um desfilar antigo de paredes sem vida,

nestas pedras levantadas só pela traça.

Há pouco vi um ligeiro rumor a passear um homem feito 
saído do fim 
da linha.

Veio barbudo de algum lugar longe daqui,
 mas ainda assim,
ainda assim,
 nem uma palavra escreveu sobre este nosso lugar.
Nada de alarmes, que tudo passa.
Um dia mostrar-te-ei as nossas roupas húmidas de tanto suor
que ia e que vinha

e que nos fez melhores.

in: "Todos os Fogos são Fevereiro"
2017 por publicar

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